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TRABALHO ESCRAVO E CAPITALISMO: UMA RELAÇÃO INERENTE

  • Foto do escritor: Wellington Silva
    Wellington Silva
  • 2 de mar. de 2023
  • 4 min de leitura

Atualizado: 30 de abr. de 2024



Florestan Fernandes, em sua obra “A Integração do Negro na Sociedade de Classes”, realiza uma análise profunda da sociologia brasileira, focando na população de cor na cidade de São Paulo entre os anos de 1880 e 1960. Essa pesquisa meticulosa tem como objetivo compreender o papel desempenhado pelos negros na sociedade pós-escravidão, bem como pelas elites dirigentes e pela sociedade em geral, durante os processos de transformações econômicas e sociais.

 

O ponto de partida de Fernandes é uma pergunta intrigante: como explicar a persistente tolerância dos negros e mulatos diante de condições tão adversas, humilhantes e indesejáveis de existência social? Essa indagação nos leva a refletir sobre as complexidades enfrentadas por essa população após o fim da escravidão.

 

Os resultados de sua investigação se assemelham aos apontamentos da professora Jane Elliott, que, em 1966, conduziu um workshop filmado por Bertram Verhaag sobre o racismo institucionalizado nos Estados Unidos. É relevante observar que o estudo de Fernandes e o experimento de Elliott ocorreram quase simultaneamente, com uma diferença de apenas dois anos.

 

Tanto no contexto brasileiro quanto no norte-americano, o processo de abolição da escravidão não resultou automaticamente na restauração plena da condição humana para os ex-escravos e seus descendentes. A vitória humanitária representada pelo fim da produção escravista não foi acompanhada imediatamente pela eliminação da inferioridade atribuída aos negros. Essa condição persistiu mesmo após a abolição.

 

Os autores com os quais dialogamos enfatizam que não foram tomadas medidas efetivas para eliminar a visão de inferioridade dos negros, nem para garantir que fossem tratados com igualdade em direitos e deveres. A sociedade brasileira e a estadunidense não conseguiram suprimir a ideia de que os negros eram indesejáveis. Assim, mesmo após a escravidão, persistiram desigualdades e preconceitos que afetaram profundamente a integração desses indivíduos na sociedade.


O fim da escravidão em ambos os países foi um marco histórico, mas sua implementação não ocorreu de forma igualitária. Na verdade, ela foi moldada para preservar os privilégios das elites dominantes e perpetuar a estratificação social necessária à acumulação e concentração do capital. No entanto, é crucial enfatizar que essa estratificação não justifica, de maneira alguma, as condições desumanas nas quais a população negra foi submetida como escrava e, posteriormente, como trabalhadora livre.

 

Fernandes e Helliott, em suas análises profundas, nos apresentam exemplos marcantes dos efeitos psicológicos e sociais da degradação humana enfrentada pela população de cor, tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil. O argumento contundente desses autores é que, embora a população branca não seja diretamente responsável pelas indignidades sofridas pelos negros na atualidade, ela é cúmplice por aceitar passivamente essa realidade e por não agir para promover mudanças.

 

As situações de anomia, inércia e conformismo enfrentadas pela população de cor após a abolição da escravidão são, para os autores, formas de resistência contra as condições materiais brutais de sobrevivência. Ao mesmo tempo, essas situações refletem a degradação profunda imposta pelo racismo, preconceito e negação da plena humanidade desses sujeitos.

 

No contexto brasileiro, Florestan Fernandes desmistifica a ideia de democracia racial e expõe a presença do racismo em nossa sociedade. Nos Estados Unidos, Helliott também revela o racismo institucional e explícito nas relações sociais, econômicas e culturais do país.

 

Em ambas as nações, o racismo, o preconceito e a segregação racial estão intrinsecamente ligados ao sistema de produção e reprodução social do capital. Essa estratificação é essencial para a manutenção e expansão do sistema, embora venha às custas da dignidade e dos direitos humanos da população de cor.


No contexto brasileiro, Florestan Fernandes, renomado sociólogo, desvela o mito da democracia racial, revelando como o racismo permeia nossa sociedade. Nos Estados Unidos, o pesquisador Helliott também expõe o racismo institucional, evidenciando suas manifestações nas relações sociais, econômicas e culturais do país.

 

Em ambas as realidades, o racismo, o preconceito e a segregação racial estão intrinsecamente ligados ao modo de produção e reprodução social do capital. A necessidade de estratificar e desqualificar grupos, tanto intelectual quanto humanamente, é uma condição para a expansão e continuidade desse sistema.

 

Olhando para a atualidade sob uma perspectiva histórica, percebemos que os casos de trabalhadores libertados de condições análogas à escravidão não são novidade. As vinícolas Aurora, Salton e Garibaldi, assim como grandes corporações como Ambev, Heineken, Zara, Apple, Dell e outras, estão diretamente vinculadas à busca incessante por lucros cada vez maiores, muitas vezes à custa da dignidade humana.

 

O trabalho escravo é inerente ao modo de produção capitalista. O sistema não sobrevive sem explorar mão de obra vulnerável. Embora em momentos de dinamismo, o capitalismo tente mostrar um falso humanismo, sua verdadeira motivação é expandir o mercado consumidor. A luta contra o trabalho escravo é apenas uma encenação, pois o fim de um implica inevitavelmente o fim do outro.

 

Para romper com essa perversidade que aflige a classe trabalhadora e desmoraliza nossa sociedade, precisamos transcender o capitalismo como modo de produção. Somente quando reconhecermos que a barbárie dos últimos cinco séculos foi provocada por esse sistema poderemos almejar uma sociedade mais justa e igualitária.


Wellington Silva, é professor de História, Mestrando em Tecnologias Emergentes em Educação pela MUST. Possui Especialização em Sociologia Política; e em História do Brasil, é Licenciado em História.



 
 
 

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